Gabriel Shinohara e Leticia Lopes
Sete meses após a última fase de implementação do Open Finance, ainda são poucos os serviços oferecidos em meio à possibilidade – sempre mediante autorização – de compartilhamento de dados dos usuários entre instituições financeiras. A modalidade foi criada para estimular a competição entre as empresas e melhorar a experiência dos usuários, mas ainda deve levar tempo para que as mudanças sejam sentidas pelos consumidores. Enquanto bancos e fintechs desenvolvem novos produtos, alguns recursos já facilitam processos como a abertura de contas e a liberação de crédito.
Lançado primeiro como Open Banking, o Open Finance é visto pelo Banco Central como uma evolução da modalidade lançada em fevereiro de 2021, e que começou com a disponibilização ao público de informações padronizadas dos produtos e serviços dos bancos.
O nome mudou oficialmente em março deste ano, porque o BC entendeu que como o sistema passou a abarcar dados além dos bancários, como os de investimentos e seguros, o termo facilitaria a compreensão do público em geral.
A maior parte das inovações prometidas no início do processo ainda não estão amplamente disponíveis, como marketplaces de crédito, iniciação de pagamento por redes sociais e uso das informações compartilhadas pelos clientes em aplicativos de planejamento familiar.
A avaliação de bancos e fintechs é que o processo de desenvolvimento é mesmo de longo prazo, visto que há uma grande complexidade não só no desenvolvimento de novos produtos, mas em padronizar e estruturar as informações de milhões de clientes de centenas de instituições financeiras diferentes.
— Como qualquer projeto de tecnologia, não funciona de primeira. Você põe no ar, precisa ajustar, equilibrar. Aí apresenta instabilidade, aquilo que você consertou quebra na semana que vem. É um processo, não é “ligou na tomada e sair usando” — explicou Leandro Vilain, diretor executivo de Inovação, Produtos e Serviços Bancários da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).
‘Recursos financeiramente atrativos’
Para ele, o projeto já avançou bastante desde a última etapa, em dezembro, mas a inovação na área de produtos ainda deve esperar. Por enquanto, bancos já estão usando dados para consumo interno, como análise de crédito e bases cadastrais.
É o caso do PicPay, que usa dados do Open Finance na liberação de empréstimo, e do Banco BV, que considera as informações para aumentar limites do cartão de crédito. No Banco Original, os primeiros recursos, lançados no fim do ano passado, ainda estão em fase de testes para uma fatia dos usuários. O foco, segundo a empresa, tem sido no desenvolvimento de recursos mais financeiramente atrativos para os clientes.
– Temos conseguido conceder crédito e aumentar limites para quem aceita compartilhar informações como o histórico financeiro de bancos que consideramos confiáveis, que têm um processo de governança bem estabelecido. Tem clientes que pelos modelos tradicionais não teriam o crédito liberado, ou apenas num valor mais baixo – afirma Fábio Lins, superintendente Executivo de Inovação e Open Finance da instituição.
No Itaú, usuários já conseguem visualizar saldos e limites de diferentes bancos no aplicativo e alguns já podem realizar pagamentos e transferências pela plataforma. Um iniciador de pagamento, para permitir que o cliente aprove transações com as credenciais da conta, independente de onde esteja o dinheiro, está em fase de testes.
Já o Mercado Pago inaugurou a modalidade em fevereiro, com a possibilidade de depósito em conta. A empresa também disponibilizou a solução para compras pagas com o Pix pela internet, utilizando o saldo de contas em diferentes bancos, e simplificando o Pix Copia e Cola.
Mais proteção
Entre os seguros e o mercado de câmbio, incluídos na quarta fase, os efeitos do Open Finance podem demorar ainda mais. Em junho, uma pesquisa do setor mostrou que a maior parte dos executivos de seguros esperam que as mudanças só devem impactar o mercado em 2024, já que o processo envolve investimentos em várias frentes, como adequação regulatória das empresas, investimento em tecnologia e em educação, tanto do mercado como dos clientes.
Já a Associação Brasileira de Câmbio (Abracam) afirma que a maior parte dos agentes do mercado não são obrigados a participar e precisam analisar individualmente se vale a pena ou não ser um participante, mas que as corretoras de câmbio vão ter que se preparar para mudanças.
Lins, do Original, também afirma que os dados do Open Finance serão utéis na prevenção de golpes financeiros, cada vez mais sofisticados. Segundo ele, a partir do histórico de movimentação financeira e de crédito do usuário, por exemplo, será possível traçar o comporamento do cliente, e antecipar condutas “fora da curva”:
– Será possível proteger mais o cliente. A ideia é checar com perguntas pessoais que só o usuário saberá responder, e enquanto tivermos dúvidas, entraremos em contato para garantir que é realmente o cliente – explica.