Por Thaís Barcellos
Brasília, 24/06/2022 – O mercado financeiro vai pedir ao Banco Central ajustes finos na proposta de regulamentação do novo marco cambial para garantir que as novas regras tragam flexibilidade à legislação. Os executivos e associações de classe ouvidos pelo Broadcast avaliam que a primeira consulta pública, que tem o objetivo de ouvir interessados no tema, caminha na direção certa de simplificação, mas poderia ser um pouco mais ambiciosa. O prazo final para enviar sugestões termina na próxima sexta-feira (1º).
Um primeiro pleito pode ser a postergação do início da vigência da lei aprovada em dezembro, hoje previsto para o fim do ano, já que a greve dos servidores do BC tem atrasado os trâmites de regulamentação dentro do órgão. A consulta pública atual se concentra em reduzir custos operacionais com a eliminação de processos considerados excessivos, diz o advogado Paulo Brancher, sócio da área de bancos e serviços financeiros do escritório Mattos Filho.
Dentre os pontos positivos, o mercado elogia o arcabouço simplificado para operações menores e a uniformização das regras para contas de residente e não residentes, enquanto representantes de bancos viram com bons olhos a simetria regulatória entre as instituições reguladas pelo BC.
Por outro lado, segundo Eduardo Miszputen, chefe de Tesouraria do Citi Brasil, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), a Anbima e a Associação Brasileira de Bancos Internacionais (ABBI) devem pedir ajustes ou maior detalhamento em quatro pontos. São eles: a mudança de exigência de contrato de câmbio para consentimento, redução de códigos de natureza da operação para transações maiores, análise de risco e flexibilidade para registro das operações no BC.
“É um pouco cedo para ficar muito contente com a flexibilização. Do jeito que a consulta foi publicada, é bom, mas um pouco aquém do que esperado. Mas estamos otimistas de que muitas das coisas que estamos pedindo vão ser avaliadas e eventualmente incluídas na versão final”, diz Miszputen.
Em relação ao contrato de câmbio, a expectativa do mercado era de que o BC eliminasse a obrigação para selar a transação. Mas, no entendimento dos executivos ouvidos, o regulador propõe o fim do documento padrão, mas indica a necessidade de um consentimento entre as partes, com um conjunto mínimo de informações. “Mas esse mínimo de informações é basicamente o contrato de câmbio inteiro. Ficamos um pouco decepcionados, porque não existe contrato de câmbio por obrigação legal nos países desenvolvidos”, explica Luiz Masagão, diretor de Tesouraria do Santander Brasil.
A redução do número de códigos para classificação da natureza da operação cambial é elogiada pelo mercado quando se limita a valores mais baixos, de até US$ 50 mil, mas ainda fica um pouco tímida para volumes maiores. Hoje, são quase 190 códigos e o BC propôs diminuição para apenas 10 em transações de até US$ 50 mil, que contemplam cerca de 90% de todos os tíquetes no País, segundo Miszputen, mas queda para cerca de 130 nas demais.
“Se você só tem 10 naturezas, cada uma é muito distante da outra, a empresa consegue escolher. Se são mais de 100, uma natureza pode ser muito parecida com outra, e vai deixar dúvidas”, completa Eric Altafim, diretor de Mesas e Produtos do Itaú Unibanco.
Hoje, a questão traz dor de cabeça, pois é responsabilidade da instituição financeira a escolha da natureza da transação e há finalidades parecidas que implicam em tributação muito diferente. A nova lei prevê a transferência dessa responsabilidade ao cliente, mas ainda indica que os bancos, corretoras e instituições de pagamento devem instruir o consumidor ou a empresa.
“A gente quer mais detalhes sobre a obrigação de assessoramento das instituições financeiras, para ter segurança jurídica de até onde vai a responsabilidade da instituição e começa a do cliente”, diz Fernando Borges, diretor da Associação Brasileira de Câmbio (Abracam), que também vai enviar manifestação ao BC.
Quanto à análise de risco da operação e à necessidade de documentação de suporte, a visão dos bancos é de que, da forma que a consulta foi escrita, as instituições são livres para definir os critérios, mas observando não só o cliente, como esperado, mas os riscos e as características da transação.
Os bancos ainda devem pedir flexibilização do prazo para o registro das operações no BC, que hoje tem limite diário. Mas, nesse ponto, a expectativa de avanço é pequena, pela necessidade maior de mudança tecnológica, diz Miszputen, do Citi. “Facilitaria nossa operação e não traria atraso significativo para o BC enxergar todas as operações e analisar os fluxos.”
Da mesma forma, a Zetta, que representa empresas de tecnologia no setor financeiro, como o Nubank, afirmou, em nota, que vai enviar manifestação para dar subsídios ao BC na discussão do marco cambial. “Pretendemos propor alternativas de aprimoramento relacionadas às questões mais práticas, que são vivenciadas na interação das associadas com seus clientes.”
Outras consultas públicas sobre o novo marco cambial estão a caminho. A próxima etapa deve ser publicada no 3º trimestre, com a parte de capitais estrangeiros no Brasil e de brasileiros no exterior. Outros dois temas devem ficar para 2023: as operações interbancárias e a polêmica e muito aguardada compensação privada de crédito.
Contato: thais.barcellos@estadao.com
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